Desistência de Gilvam Borges da chapa com Jaime Nunes revela teia de acordos espúrios nos bastidores da campanha
Por Richard Duarte
CANDIDATURA EM DECLÍNIO
A campanha eleitoral no Amapá mal começou e o clima de cisão no entorno do empresário e vice-governador Jaime Nunes, candidato ao governo do Estado pelo PSD, descortina o crescente conflito de interesses entre os diferentes personagens envolvidos nesta trama digna de Charles Maurice de Talleyrand (1754-1838), um dos políticos mais habilidosos da França entre os séculos 18 e 19, exímio conspirador e temido pela astúcia.
O enredo em questão evidencia um grupo político dominado por antagonismos latentes, mantido com manobras nada republicanas operadas nos bastidores por reluzentes lideranças dos partidos favoráveis à candidatura “jaimista”.
Começa com o ex-senador Gilvam Borges, godfather do MDB local, sinalizando que trocaria a pré-candidatura para Senador pela de vice-governador na chapa com Nunes. E segue, ecoando no gabinete do prefeito de Macapá Antônio Furlan (Cidadania), principal cabo-eleitoral de Nunes, entusiasta e fiador da candidatura ao Senado da própria esposa, a secretária de Mobilização e Participação Popular da Prefeitura de Macapá (SMMP/PMM) Rayssa Furlan, como um incômodo badalar de sinos noturnos.
Numa trama bem urdida, em que valeu dissimular, pressionar e até ameaçar, Borges logrou êxito temporário com a indicação para vice na chapa do dono da Domestilar. Negociou com Furlan para que Rayssa desponte como única candidata emedebista ao Senado, sinalizou amplo apoio à reeleição do deputado federal Acácio Favacho, estreitou mais ainda a proximidade com a aliada, vice-prefeita de Macapá Mônica Penha.
Enfim, Gilvam Borges fez o diabo pelo segundo cargo mais importante na administração pública estadual.
Mesmo com todo esse esforço, não conseguiu sustentar-se por muito tempo como candidato a vice-governador. Nas redes sociais, a notícia da indicação motivou violentas reações, provocando constrangimentos nos integrantes da equipe de trabalho de Jaime Nunes.
Borges começou a sentir os efeitos do próprio veneno, tornando-se alvo de pressões internas para que desistisse da disputa pelo cargo de vice.
Na terça-feira, 25 de julho, o ex-senador da República, nacionalmente conhecido pelos anos de servilismo às diretrizes de outro ex-senador, o maranhense José Sarney (MDB), reuniu convidados e apaniguados na sede do partido em Macapá, à avenida Procópio Rola, para comunicar a desistência da candidatura a vice, condicionando sua decisão à indicação do cargo a outro filiado ou filiada emedebista.
O anúncio igualmente repercutiu nas redes sociais. Principalmente por conta do semblante desgostoso exibido por Borges enquanto Antônio Furlan fazia a leitura da nota oficial. Para Maurice de Talleyrand, ex-ministro das Relações Exteriores de Napoleão Bonaparte, “situações existem em que não dá para ficar em cima do muro tentando compor e compatibilizar os contrários”
Naquele momento, quem saberia dizer o que importava para o velho cacique? Certamente, enquanto cofiava a barba devia estar mensurando seus ganhos políticos, contabilizando mentalmente os próprios quinhões e bolando estratégias para preservação de seus feudos particulares.
Às vésperas de um processo eleitoral que se prenuncia o mais complexo dos últimos pleitos, o experimentado Gilvam Borges sabe que se ficar outra temporada fora do Congresso Nacional arrisca perder “seu” MDB para o deputado federal Acácio Favacho, outro político tão ambicioso e voraz quanto ele foi e ainda tenta ser. E com algumas vantagens a favor de Favacho, dentre elas a juventude e o talento em reciclar o esdrúxulo regional em finos biscoitos globalizados.
O projeto intimamente acalentado por Acácio Favacho, desde sua eleição à Câmara dos Deputados em 2018, é assumir o controle do MDB Amapá sem a necessidade de grandes rupturas internas. Gradualmente, ele avança para solapar o poder de Gilvam Borges, enfraquecendo-o como liderança política dentro e fora do partido.
O ardiloso ex-senador tem observado esses movimentos, e vem manobrando dentro do partido para esvaziar o apoio à reeleição de Acácio Favacho, procurando romper o círculo intra partidário dele, mantendo-o à distância das principais diretrizes do partido.
Exemplo é a provável indicação de Ivna Deise para vice na chapa de Nunes. A médica seria candidata à deputada federal. O ainda habilidoso político terá sob seu controle para dispor de maior capacidade ofensiva, atraindo novas composições para conter as pretensões de Acácio Favacho.
Na verdade, o recuo de Gilvam Borges abriu um leque para interpretações variadas sobre as frágeis pilastras de sustentação da candidatura de Jaime Nunes, reconhecidamente um político em formação, com pouco conhecimento sobre os conchavos subterrâneos que permeiam os acordos político-partidários.